sábado, 15 de setembro de 2007

Eva

Acabara de sair do banho, estava no quarto, os cabelos ainda molhados. Era de manhã e comia uma maçã no desjejum sentindo aquele frescor na cabeça e na nuca. Viu-se no espelho de relance e pensava em nada, era exatamente aquilo, nua comendo maçã. Se alguém estivesse a olhá-la através janela da sacada se encantaria com a maneira afável e a singeleza de seu corpo delgado de menina e jamais desconfiaria que estivera observar aquela que fora a culpada primeira de todos pecados. Eva, achou graça do que refletir no espelho e mordeu a fruta que já estava meio velha.
A graça foi de identificar, de repente em si, a mesma ingenuidade desde a época em que era a única mulher no mundo. Quantas vezes... quantas vezes ela soubera o que não devia fazer, era óbvio que ia dar merda, arrepender-se-ia depois, e fizera assim mesmo e, de fato, estragou tudo?
Eram atitudes completamente irracionais, eu sei, alguns diriam estúpidas, bem sabe Eva. Tanto que ela própria sentencia-se imbecil quando age de tal forma além de sentir muito pelos que acabam atingidos. Também não admite as desculpas de que foi inevitável ou que poderia acontencer a qualquer um, pois sabia, a culpa era sempre mesmo toda sua.
Mas ria... bem, e de que adiantaria ficar se lamentando por toda eternidade à frente ou atrás? Sua condição de não poder mudar o que estava feito e de ter de aguentar as conseqüências e julgamentos alheios lhe era frustrante, mas não havia como mudar o passado e nem conseguia ficar se remoendo por muito tempo. Afinal, se existe alguém que a entende realmente e que conhece os motivos de ter assim agido, este era exclusivamente ela. Por isso se perdoava. E retrocedendo nas memórias ria - ria daquele instante, pois a verdade é que existe um momento em que não faz sentido seguir se não fizer o tal ato proibido, porque é preciso saber o que acontece - "o que acontece se". Ria de como se sentia sempre indefesa frente essa cíclica fatalidade, vendo sua alma ser tomada por algo que não era mal, era apenas não devia fazer, mas ninguém explicou o porquê.