sábado, 3 de maio de 2008

antes do mundo acordar

Meu desgaste não é físico, nem quero desligar-me dessa consciência de agora, quero apenas afastar-me da consciência dos outros. Permaneço na madrugada tranquila pois é quando se está só e se pode descansar do resto. Se durmo, quando eu levanto o mundo já está de pé de novo e há muito tempo. Assim não dá... quem é que tem sossego com essa gente indo e voltando, se comunicando sem parar e inovando e acontecendo sempre, sempre e sempre?
O problema maior de se entregar ao sono é que de manhã já terei a rotina a me esperar. Quero viver cada uma dessas horas leves e escuras.
Não são preciosos aqueles segundos ao acordar, em que as lembranças ainda não chegaram? Mas elas vêem e moldam a minha cara no travesseiro, o buraco de um corpo no colchão, a realidade novamente; não quero isso - não agora, talvez outro dia. Até amanhecer fico num tempo em que o mundo permanece à vontade, sem que ninguém olhe, escute, em que ninguém saiba nem se interesse.
Nesse isolamento a concentração acontece mais fácil. E nesse estado tudo o que a gente faz fica melhor, pelo menos é o que se acredita. Espero que seja verdade, preciso melhorar algumas coisas, só não sei se quero o bastante, vou esperar o pãozinho sair.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

desejos primários

Os dias e eu seguíamos num natural e tranquilo compasso, até que ele apareceu. Quando percebi, tinha-me posto a observá-lo. Censurei-me no início e voltei a me focar no que fazia antes, mas era como se eu tivesse desaprendido a técnica, senti-me mal acabada. A naturalidade com que eu existia simplesmente apagou-se.
Tudo o que ele fazia parecia mais divertido, surgia um inevitável desejo de fazer igual e era tão forte que eu não conseguia sossegar. Então eu tentei imitá-lo, até me de dei bem, não era difícil afinal, mas era sempre mais chato quando eu fazia. Eu olhava para o lado e novamente ele estava fazendo algo que parece melhor. Era um problema crônico, eu nunca o alcançaria.
Larguei mão... não adiantava me exaurir e frustrar. Meu interesse ainda era algo quase místico - jamais havia sentido algo assim - mas eu não precisava enfim entendê-lo, procurei outros modos de lidar com isso. Parei de gastar meu tempo observando-o: deixei-o, assim, como só ele sabe fazer. Apenas apareço pra pra ver como as coisas que ele fez ficaram no final e então pego de suas mãos, tomo pra mim e está resolvido.
Hoje, ao pensar há quanto tempo isso se estende me sinto exausta, porque na verdade eu queria muito parar, mas não posso, toda vez que ele aparece é a mesma coisa. A vontade que ele desperta não finda...
Por isso tomei uma decisão - e não me importa como a julguem - achei melhor mantê-lo junto a mim. Dispus-me a protegê-lo, a ouvi-lo, também o fiz sorrir e depois chorar - para mostrar como precisava de mim. O fiz feliz e então pude tomar a felicidade dele pra mim.



fundo sonoro: Just - Radiohead