segunda-feira, 20 de abril de 2009

o que não desce na descarga

O elefante assiste o segundo em que eu abro os olhos e os primeiros movimentos do corpo que quer se render, me debruço, me enrolo, querendo voltar à escuridão insípida do sono. Ele sabe o peso que me é ao acordar, ele é o peso.
Não o olho mais, antigamente passava noites em claro fitando-o.
Quando levanto vou direto ao banheiro, vagarosamente sento e esvazio a bexiga, lavo a cara e volto pro quarto para puxar os lençóis. Aliso, arrumo, e por último - e completamente irrelevante - modelo o travesseiro. Não sei mais julgar quanto estou melhor ou pior. Aqui dentro é como se eu nunca arrumasse a cama.
São fases em que o tempo diferente, tempo em que a saudade não existe. Nem nem sua cogitação é bem-vinda.
O elefante apenas observa, possui aquela sabedoria paciente de quem tem consciência de seu tamanho. O que foi feito não tem volta, mas também não tem como apagar... É preciso continuar vivendo, por isso passo a agir de forma a ignorá-lo, ou seja, não tomando atitude alguma a respeito. Praticamente não se escolhe e se costuma com o peso. Não posso fingir que não é nada, mas também já não é mais nada de novo - daí minha indiferença.
Se ele ficará eternamente, acredito que não. Estes seres sabem a hora de ir embora - quando sentem que vão morrer - e vão em paz. Até lá pretendo parar de desejar que para cada elefante desta cor, exista um outro, de mesma magnitude, mas de uma cor azul de culpa, no quarto quem não mede o que faz.



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